Informativo: 638 do STJ – Processo Penal
Resumo: É nula a sentença proferida de forma oral e degravada parcialmente sem o registro das razões de decidir.
Comentários:
De acordo com o art. 405, § 1º, do CPP, o registro do interrogatório e dos depoimentos em audiência será feito, sempre que possível, pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações.
Na prática, vem sendo cada vez mais empregado o meio audiovisual, pelo qual o depoimento das testemunhas e vítimas e o interrogatório do réu são tomados através de uma câmera, com um microfone instalado diante do depoente, o que permite total fidelidade, eis que se evita que um serventuário da Justiça ouça o que está sendo narrado e transfira o conteúdo para o papel, processo que pode, por inúmeras razões, resultar na perda da fidedignidade. A importância conferida a esse meio de registrar o ocorrido nas audiências é tamanha que o STJ tem decidido que, uma vez disponíveis os meios de gravação, é obrigatório que o juiz os utilize, sendo-lhe defeso escolher outra forma que lhe pareça mais adequada (HC 428.511/RJ, j. 19/04/2018).
Considerando que a gravação é plenamente suficiente para registrar com precisão todas as declarações feitas na audiência, o § 2º do art. 405 dispensa expressamente a transcrição do que foi gravado. Ora, se tudo está fielmente registrado em áudio e vídeo, não faz sentido, por uma questão de economia processual, impor a transcrição, que simplesmente repetirá o que já está registrado. Por esta razão, o STJ firmou a tese de dispensa da transcrição, a não ser que haja efetiva necessidade:
“1. O registro audiovisual de depoimentos colhidos em audiência dispensa sua degravação, salvo comprovada demonstração de sua necessidade. Interpretação do art. 405, § 2º, c/c o art. 475 do Código de Processo Penal. Orientação normativa do CNJ. Precedentes. 2. As inovações introduzidas no Código de Processo Penal pelas Leis ns. 11.689/2008 e 11.719/2008 atenderam ao objetivo de simplificação e economia dos atos processuais, bem como ao princípio da oralidade na produção da prova em audiência. 3. Recurso em mandado de segurança não provido.” (RMS 36.625/MT, j. 30/06/2016)
Note-se que o tribunal se orienta nesse sentido inclusive no que diz respeito ao registro da instrução no plenário do júri, apesar de o parágrafo único do art. 475 dispor que “A transcrição do registro, após feita a degravação, constará dos autos”. Para o tribunal, a ausência de transcrição nos procedimentos do júri só acarreta nulidade se comprovado o prejuízo (HC 422.114/RS, j 24/04/2018).
A dispensa de transcrição não se aplica, no entanto, para a sentença proferida e também gravada ao final da audiência (art. 403 do CPP). É imprescindível que se providencie a transcrição integral da sentença porque o art. 405, § 2º não se aplica a este ato judicial:
“De início, destaca-se que o art. 405 do Código de Processo Penal possibilita o registro dos termos da audiência de instrução em meio audiovisual. Tal regra, cuja redação foi conferida pela Lei n. 11.719/2008, não tem o escopo somente de abreviar o tempo de realização do ato – em razão da desnecessidade da redução, a termo, dos depoimentos do acusado, vítima e testemunhas –, mas também o de possibilitar registro fiel da íntegra do ato, com imagem e som, em vez da simples escrita. Na hipótese, foi proferida sentença oral, com a degravação tão somente da dosimetria das penas e do dispositivo. Essa situação, em um juízo preliminar, contraria o disposto no art. 388 do Código de Processo Penal, pois a busca da celeridade na prestação jurisdicional não dispensa a forma escrita da sentença, que deve vir acompanhada das razões de decidir. Anote-se, por fim, o prejuízo à defesa, com grave dano ao exercício do contraditório e ampla defesa, que acarreta nulidade absoluta do ato, por vício formal.” (HC 470.034/SC, j. 09/10/2018)
Ainda no mesmo sentido:
“2. Hipótese em que o paciente foi condenado por meio de sentença penal condenatória oral cujo registro apenas audiovisual consta dos autos, o que foi mantido pelo Tribunal de origem.
3. Em prol dos princípios da razoável duração do processo e da celeridade processual (art. 5º, LXXVIII, da CF), o legislador federal, por meio da Lei n. 11.719⁄2008, promoveu, entre outras, alteração no Código de Processo Penal, consistente na inserção dos atuais §§ 1º e 2º do artigo 405, os quais passaram a permitir o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas apenas por meio audiovisual, “sem necessidade de transcrição”. Precedentes.
4. Nas alterações promovidas pela Lei n. 11.719⁄2008, não se estabeleceu a possibilidade de se dispensar a transcrição de sentença penal registrada por meio audiovisual (ex vi, do título XII do CPP). Ao contrário, manteve-se o art. 388 do CPP, que prevê a possibilidade da sentença “ser datilografada”, admitindo-se, na atualidade, a utilização de outros meios tecnológicos similares, como por exemplo o computador, para o seu registro escrito. Daí a inaplicabilidade do disposto no art. 405, §§ 1º e 2º, do CPP – que permite a dispensa de transcrição de depoimentos – à sentença penal.
5. No caso em exame, a sentença penal condenatória foi colacionada aos autos por meio de registro audiovisual, existindo apenas transcrição parcial do seu conteúdo, consistente nos fundamentos da dosimetria e no dispositivo da sentença, não havendo menção das razões do convencimento do magistrado acerca da autoria e da materialidade do crime, nem da sua convicção pela livre apreciação da prova produzida, em afronta do preceito inscrito no art. 155 do CPP.
6. A ausência de registro escrito dos termos da sentença penal condenatória dificulta o exercício do contraditório e da ampla defesa – princípios consagrados no art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal –, ainda que, nos autos, conste o registro de parte da sentença penal prolatada por meio audiovisual.
7. Não atingida a finalidade e existindo vício formal no ato, resta evidente o prejuízo à ampla defesa e ao contraditório, não devendo subsistir a forma utilizada pelo Juízo singular, embora hígido o conteúdo material da sentença.” (HC 336.112/SC, j. 24/10/2017)
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