Compete à Justiça Federal, nos termos do art. 109, inc. IV, da Constituição Federal, julgar “os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral”.
No geral, considera-se presente o interesse da União nos crimes cometidos por funcionários públicos federais no exercício da função, ainda que o sujeito passivo imediato da ação criminosa não seja o ente público. Como exemplo, podemos citar decisão recente do TRF da 1ª Região na qual se estabeleceu a competência da Justiça Federal para julgar servidor público que, designado para trabalhar em um programa promovido pelo governo federal que visava a fornecer atendimento médico a comunidades indígenas, aproveitou-se das circunstâncias proporcionadas por seu cargo para submeter uma adolescente indígena à humilhação de ser fotografada em conotação pornográfica enquanto utilizava vestimentas culturais características (RESE 0001224-85.2018.4.01.4200/RR, j. 25/06/2019).
É a mesma orientação seguida pelo STJ:
“1. Compete à Justiça Federal processar e julgar crime praticado por funcionário público federal, no exercício de suas atribuições funcionais. Precedentes.
2. Tal entendimento deriva do fato de que, ao atuar na qualidade de preposto da empresa pública federal, o acusado a representa e, por consequência, o cometimento de crime no exercício da função pública atinge diretamente a imagem da instituição. 3. Situação em que, em processo de renegociação de contratos bancários celebrados com a Caixa Econômica Federal (financiamento de imóvel, limite de cheque especial em conta corrente e empréstimo pessoal) e inadimplidos, o gerente de contratos da instituição financeira, no exercício de sua função na empresa, teria qualificado a querelante de “safada sem vergonha”, “mal caráter” e “pilantra”, em contato telefônico. 4. Conflito conhecido, para declarar a competência do Juízo Federal da 14ª Vara da Seção Judiciária do Paraná, o Suscitante.” (CC 147.781/PR, j. 14/09/2016) |
É, no entanto, pressuposto que o agente esteja no exercício da função, pois, do contrário, sua qualidade de funcionário se torna indiferente para o estabelecimento da competência, afastando-se o interesse da União. Por isso, ao julgar o HC 157.012/MS (j. 10/12/2019), o STF denegou a ordem e afastou a competência da Justiça Federal para julgar policial rodoviário federal que havia cometido homicídio enquanto se dirigia ao trabalho.
De acordo com a impetração, no dia dos fatos o policial deixou sua residência num veículo particular e se dirigiu à rodoviária de Campo Grande/MS, onde tomaria um ônibus até a cidade de Corumbá, onde se localizava o posto da Polícia Rodoviária Federal em que trabalhava. No caminho, um motorista de outro veículo, aparentemente embriagado, desrespeitou a sinalização de trânsito e quase colidiu com o veículo do policial. Após uma discussão decorrente de outra manobra imprudente daquele indivíduo, o policial disparou sua arma e o matou, ferindo também outras duas pessoas.
O processo pelo homicídio foi iniciado na Justiça Estadual, mas o impetrante pretendia que, devido à sua condição de policial federal, a competência fosse deslocada para a Justiça Federal.
A 1ª Turma do STF decidiu por unanimidade que não se trata de competência federal porque o policial não se encontrava no exercício da função. Tratou-se de uma desavença pessoal, não relacionada com nenhum dever de ofício, que afasta qualquer interesse da União.
Para se aprofundar, recomendamos:
Livro: Código de Processo Penal e Lei de Execução Penal Comentados por Artigos