Informativo: 679 do STJ – Direito Penal
Resumo: A tenra idade da vítima é fundamento idôneo para a majoração da pena-base do crime de homicídio pela valoração negativa das consequências do crime.
Comentários:
Dos crimes contra a pessoa, destacam-se aqueles que eliminam a vida humana, considerada o bem jurídico mais importante do homem, razão de ser de todos os demais interesses tutelados. Na busca do conceito de homicídio, trazemos a clássica definição de Nélson Hungria:
“O homicídio é o tipo central de crimes contra a vida e é o ponto culminante na orografia dos crimes. É o crime por excelência. É o padrão da delinquência violenta ou sanguinária, que representa como que uma reversão atávica às eras primevas, em que a luta pela vida, presumivelmente, se operava com o uso normal dos meios brutais e animalescos. É a mais chocante violação do senso moral médio da humanidade civilizada” (Comentários ao Código Penal, v. 5, p. 25).
Teoricamente, a vida humana é tutelada de forma equivalente independentemente das características da pessoa. Há, no entanto, situações que, nas últimas décadas, têm sido consideradas mais graves a ponto de justificar uma pena maior em razão das condições da vítima. Em 2015, por exemplo, a Lei 13.104 inseriu no art. 121 do CP a qualificadora do feminicídio; e, em 1990, a Lei 8.069 já havia alterado o § 4º do art. 121 para estabelecer uma causa de aumento de pena nas situações em que o homicídio doloso envolvesse menores de quatorze anos. Recentemente, a Terceira Seção do STJ firmou a orientação de que é possível aumentar a pena-base em homicídios que vitimam pessoas entre quatorze e dezoito anos, tendo em vista que matar alguém nessa idade traz consequência mais graves, inclusive para a família, do que as provocadas em crimes contra pessoas de mais idade.
Havia, na verdade, divergência entre a 5ª e a 6ª Turmas do tribunal a esse respeito. A 5ª Turma admitia o aumento (AgRg no HC n. 334.899/RS, DJe 13/03/2020), ao passo que a 6ª Turma o recusava por considerar que a idade da vítima é “inerente ao delito” (AgRg no REsp n. 1.695.315/PA, DJe 11/05/2018). No julgamento conjunto, assentou-se que
“Em princípio, o homicídio perpetrado contra vítima de tenra idade (adolescente ou criança) ostenta reprovabilidade idêntica àquele perpetrado contra um adulto, pois ambos vulneram o objeto jurídico tutelado pela norma (vida).
Não há como ignorar, no entanto, o fato de que o homicídio perpetrado conta a vítima jovem ceifa uma vida repleta de possibilidades e perspectivas, que não guardam identidade ou semelhança com aquelas verificadas na vida adulta.
Há que se sopesar, ainda, as consequências do homicídio contra vítima de tenra idade no núcleo familiar respectivo: pais e demais familiares enlutados por um crime que subverte a ordem natural da vida. Não se pode olvidar, ademais, o aumento crescente do número de homicídios perpetrados contra adolescentes no Brasil, o que reclama uma resposta estatal.
Não ignoro que o legislador ordinário estabeleceu – no art. 121, § 4º, do Código Penal – o aumento de pena para o crime de homicídio doloso praticado contra pessoa menor de 14 ou maior de 60 anos. Nada obsta, contudo, que o magistrado, ao se deparar com crime de homicídio perpetrado contra uma vítima com 14 anos de idade ou mais (mas com menos de 18 anos), aumente a pena na primeira fase da dosimetria, pois, como referenciado acima, um crime perpetrado contra um adolescente ostenta consequências mais gravosas do que um homicídio comum.
Assim, deve prevalecer a orientação no sentido de que a tenra idade da vítima (menor de 18 anos de idade) é elemento concreto e transborda aqueles inerentes ao crime de homicídio, sendo apto, pois, a justificar o agravamento da pena-base, mediante valoração negativa das consequências do crime, ressalvada, para evitar bis in idem, a hipótese em que aplicada a causa de aumento prevista no art. 121, § 4º (parte final), do Código Penal” (AgRg no REsp 1.851.435/PA, j. 12/08/2020).
Para se aprofundar, recomendamos:
Livro: Manual de Direito Penal (parte geral)
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