Em 23.3.2020 foi publicada a Lei 13.981/2020, que altera a faixa de renda para obtenção do benefício de prestação continuada da Assistência Social (Lei 8.742/1993). O limite de renda per capita familiar mensal foi elevado de ¼ para ½ salário mínimo, passando a acomodar mais pessoas nessa política pública. Veja-se a nova redação do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993:
- 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/2 (meio) salário-mínimo.
Doravante, os idosos com mais de 65 anos e as pessoas com deficiência que não tenham condições de prover seu sustento, ou sua família fazê-lo, farão jus a um salário mínimo mensal, desde que sua renda mensal per capita seja inferior a 1/2 (meio) salário-mínimo. Anteriormente, como se falou, o critério econômico era possuir renda per capita familiar mensal inferior a ¼ do salário mínimo.
Esse tema é um dos mais discutidas nas ações previdenciárias. Tanto o STJ (REsp repetitivo 1.112.557/MG) como o STF (em uma série de reclamações constitucionais) já indicaram que é possível ao Judiciário utilizar outros critérios de prova, além do critério de renda, para a comprovação da situação de hipossuficiência econômica. Assim, a alteração trazida pela Lei 13.981/2020 vem em boa hora.
Quais os reflexos processuais dessa inovação legislativa?
O efeito processual mais notório decorre da aplicação do artigo 493 do CPC:
Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão.
Parágrafo único. Se constatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes sobre ele antes de decidir.
Assim, o direito superveniente se aplicará aos processos em curso, inclusive em segundo grau de jurisdição. A restrição contida no art. 1.014, do CPC, que permite a apresentação, na apelação, de questões de fato não apresentadas no juízo inferior somente quando houver motivos de força maior, não se aplica às questões de direito:
“Note-se um importante detalhe: o art. 1.014 do CPC não trata da alegação de fatos novos (supervenientes). Estes podem ser veiculados, na apelação ou outro momento, porque o art. 493 do CPC assim autoriza expressamente.
O objeto da norma são os fatos antigos que não foram alegados a seu tempo. Se houver justo motivo, podem ser veiculados de forma inédita na apelação. Atente-se apenas para a necessidade de contraditório.
Por fim, a restrição alcança apenas as questões de fato, mas não as de direito, que podem ser alegadas a qualquer tempo, em razão do princípio processual juria novit cúria. Igualmente, não limita a possibilidade de levantar aquelas questões não alcançadas pela preclusão.”
(DONOSO, Denis; SERAU JR., Marco- Aurélio. Manual dos Recursos Cíveis – Teoria e Prática, 5ª ed., Juspodivm, 2020, p. 185-186)
Por fim, deve-se falar da coisa julgada. Nas ações previdenciárias, em especial naquelas em que se busca o benefício de prestação continuada da Assistência Social, há o entendimento pela possibilidade de relativização da coisa julgada, admitindo-se a propositura de nova demanda com a mesma finalidade, pois haveria mudança no quadro fático da insuficiência econômica ou novas provas a demonstrar esse quadro de hipossuficiência econômica (coisa julgada secundum eventum probationis).
Cremos que a novidade trazida pela Lei 13.981/2020 não ensejará, imediatamente, o ajuizamento de ações rescisória, pois os pressupostos legais são diferentes, nem tampouco a mencionada tese da flexibilização da coisa julgada, mas será possível, de outra forma, o requerimento de novo pedido administrativo perante o INSS, já nos termos da nova legislação e, no caso de eventual indeferimento administrativo, novo ajuizamento perante o Poder Judiciário, pois aí a causa de pedir será diversa.
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